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sábado, 23 de março de 2013

Sexagésima Quarta Carta: Minta que esqueceu.

"Talvez eu acredite que você nunca mentiu pra mim... Por um pequeno momento eu vou me forçar a compreender o que te impede de arriscar, de tentar, de fazer tudo o que disse que tinha vontade - aquele 'universo paralelo' onde tudo era perfeito que você me contou, ainda se lembra? Penso que não. Talvez até seja esse o problema. Talvez você nunca tenha mentido, e eu espero de todo meu coração que nunca tenha mentido, ao menos para que eu aos poucos não comece a temer o que sai de sua boca, como que toda vez isso me fere profundamente. Você sempre disse coisas boas para o futuro, e espera melhor que eu e com mais 'otimismo' que tudo vá se resolver. Conversamos sobre isso... A situação apenas me diz que dizeres ruins doem na hora, mas dizeres bons doem muito mais tarde, quando deixam de ser ditos, quando criam a dúvida quanto a ser mentira ou não. Mas talvez você nem se lembre de tudo o que disse. Talvez tenham sido só palavras, talvez estivesse sob efeito de algo... sono ou remédios, quem sabe? Eu realmente espero que nunca tenha mentido pra mim, embora eu saiba que já o fez, porque... é tão nítido, uma mentira e uma tristeza quase tangível. Eu só quero acreditar que nada foi mentira, mas em contrapartida vou pensar até morrer que você se esqueceu, que deixou pra lá, que não faz parte mais da sua memória, e o fato de que as pessoas ou metem ou esquecem vai me seguir até que não haja mais ninguém para confiar. Não só mentiras quebram uma confiança, mas também o que é dito em vão. Não pediria para ligar e para que me atendesse se eu tivesse a certeza de que não iria esquecer do que eu dissesse. 'Alô? Liguei só pra avisar que estou com saudades, e que te amo muito.' 'O que? Não ouvi.' 'Nada não, deixa pra lá.' É, eu ainda lembro desse dia. Aliás, lembro de todos os dias. Eu não preciso de algo para me agarrar como memória. Vale o que eu tiver dentro da minha cabeça, o que é quase infinito quando diz respeito a você e... Eu poderia rasgar estas fotos, queimar estas cartas, desligar os celulares e desaparecer, mas ainda sim lembraria de tudo, saberia de tudo, e teria a consciência de que não menti e nem esqueci. Mas talvez você tenha razão... memórias... elas machucam sempre. Talvez você tenha aprendido isto primeiro do que eu, por isso eu não entendo tão claramente, mas... Me deixe ajudá-la a não mentir, a não esquecer, e também ao melhor do que posso saber: lembrar do que realmente é bom, e reservar sua memória para o que te faz sorrir. Se ao menos eu entendesse isso. Em partes, até entendo - o pior é estar acorrentado aqui com tanta coisa na cabeça. Eu releio cartas, relembro momentos, revejo fotos, mas mesmo que elas digam tão pouco, tudo dentro da minha cabeça se revira, salta para o teto e sai de cá para se misturar ao ar, até que eu volte a respirá-las de volta para a minha cabeça. Só se pergunte, antes de dormir: 'onde foram parar todas aquelas palavras?', porque eu não sei se vou sofrer mais se for mentira ou se tiveres se esquecido de tudo por ter sido tudo em vão."

Cartas Diretas,
obrigado.

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