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quarta-feira, 12 de junho de 2013

Septuagésima Primeira Carta: Feliz Dia da Vida.

"O que sobra de um velho coração? O que resta de uma peça qualquer quando ela é quebrada em milhões e milhões de pequenos pedaços inúteis que, por mais que tenham o minimo resquício de vida, parecem tão falecidos? Ela me deu a resposta como um sopro calmo da brisa do outono: salvar. Ela sabe melhor do que ninguém como tornar o velho em novo, como regenerar a vida naquela peça quebrantada, como salvar a vida de um homem.

Durante muito tempo eu pensei sobre o que definia alguém vivo ou morto. Nunca me incomodei com arranhões, ralados, torções, luxações, quebras... nada podia quebrar uma barreira morta, nada poderia movimentar uma dor num lugar morto. E descobri com tudo isso que não precisava de um elemento físico para estar morto, que não precisa de um coração parando de bater, uma cabeça parando de agir e um sangue correndo cada vez mais lento pelas artérias. Na verdade, a vida foi sendo uma palavra sem significado para mim, chovesse o quão chovesse, gota de água alguma me tocava, e se o fizesse, não era notada. A verdade acima desta é que nada mais reluzia significado dentro do dia-a-dia, podia estar claro ou escuro, mas eu não ligava mais - estava tão desmembrado de minha vida que nunca voltaria a entendê-la senão por uma falta imensa do que é ser feliz. Era como estar trancado em sua própria cabeça, mas sem querer fugir, e cada dia que passava era apenas um dia, vivendo absorto na sustentação de um batimento cardíaco qualquer, pois bastava o primeiro para condenar que estava vivo, se é que isso realmente julgava-me tal especialidade. Não. Viver não é ter um coração batendo. E, até então, eu não sabia o que era estar vivo.

Não obstante, sabia o que era estar morto. Sabia muito bem, pois vivia dias e dias como se fosse uma programação qualquer num lugar gelado sem nada para fazer, fazendo o que tinha de ser feito simplesmente por... fazer. Objetivos e conclusões, objetivos e falhas. Apenas acarretava em consequências, significativas ou não. Só isso tinha algum significado, algum resquício disso, afinal toda consequência vem com seu impacto, mas a perceptividade é um fruto da mente do condenado. E, como antes disso, não importava - eu estava desmembrado do meu real significado de vida.

Com isto, aprendi que precisava apenas ligar para executar meus planos e mais nada para estar morto. Acabou que isto se tornou uma questão de patamar emocional, não mais físico.

Porém isto mudaria, como tudo muda, bem ou mal, até que se entrelaçasse como uma coisa só, resgatando apenas as nuances de suas diferenças. Bastou ela apenas entrar na minha vida. A pele alva, madeixas negras e inspirando vida com suas curvas, um corpo belo e bem esculpido, ao contrário da imagem magricela e sem vida de um demônio escarrado por sua desistência: a desistência de viver. Fazia falta aquele significado, tal que era a única substância que o ligava a se importar com o que era viver. Fora isto, mais nada. Mas lá estava ela, adentrando em minha vida sem pedir qualquer tipo de licença, não por falta de educação, mas porque subconscientemente ela sabia, melhor que ninguém, o que precisava fazer.

Dar um novo significado.

Demorei muito para entender o que era ser completo, e hoje, depois de muito que vivemos juntos, ela me ensinou apenas com sua amizade e por um amor platônico da minha parte que eu precisava ser completo. Ela com sua amizade, estando ao meu lado sempre, me ensinou o que era, enfim, viver: EU PRECISAVA. Precisava desse significado, dO significado. Ela me deu como num presente divino, como... espere... um anjo da guarda... Será?

Apareceu na minha história e me mostrou que eu estava errado. Eu não tinha uma história. Eu tinha algo maior. Eu tinha vida. ORA! Eu estava errado, claro. Como sempre estive. E ela não me enquadrou em um artigo penal para me fazer sentir mais culpado ainda - ainda que eu o faça. Mas de todo modo, ela me ensinou uma lição que se tornou o significado da minha vida, o significado do que é ter vida: eu precisava querer viver, e sentir estar fazendo isto. Bastou.

Muito tempo se passou ao lado dela, sobrevivendo com este significado e, quando notei, havia sim algo que fazia sobrar de um velho coração quebrantado: a vontade de ainda viver. E com seus sorrisos, únicos e indestrutíveis, ela salvou toda a minha vida. Notei, assim, que precisava dela na minha vida, para me manter em movimento, para me conquistar e me salvar todo santo dia, e caso eu perdesse aquele significado de novo, o sorriso dela o traria de volta, e curaria qualquer maldita chaga que ousasse aparecer em meu tecido cardíaco recém-recuperado. Ela sabe muito bem como salvar a vida de uma pessoa, e bem o faz com qualquer pobre animal na sarjeta, como bem fez comigo. Ela salva vidas, e talvez para isso tenha vindo até mim, para salvar minha vida e mantê-la viva. Assim, tomei-a como a principal engrenagem da minha vida.

É por isso que eu preciso agradecer, por agora viver e poder saber o que é isso. Não é drama, mas a verdade é que só se sabe o que tem quando se recupera. Eu já vivi antes, claro, e sabia bem o que estava fazendo, mas não sabia o que tinha. Sabia que vivia, mas não vivia por querer, vivia por ter de viver e por não saber o que era morrer. Falecer por dentro. Ela apareceu e me deu de volta O significado de viver, assim, eu dobrei o valor que essa vida tem, dobrei por 100 a vontade de viver e a importância que isso tem, pois preciso estar em movimento para vê-la sorrir. E é muito melhor fazê-la sorrir, saber que estou sendo curado por algo que vem dela, algo que eu ajudei a construir.

Por isso preciso que ela saiba que me salvou, que me agarrei a essa visão do que realmente é viver.

Fabiane... muito obrigado... por tudo. Você sabe bem... sabe melhor do que ninguém... como salvar a vida de um pobre homem.

Feliz dia dos namorados. Feliz nosso dia. Feliz dia da vida."

Cartas Diretas,
obrigado.

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